23 de maio de 2019
As ferramentas oferecidas pelos aplicativos de rede social possibilitam muitos modos de se portar na internet. Os usos da rede são incrementados a cada novo software desenvolvido ou com as atualizações dos existentes. A criação do Snapchat, em 2011, por Evan Spiegel, configura um exemplo de inovação nos hábitos de navegação online: deste app originou-se a publicação de stories,uma prática que foi se popularizando com o decorrer dos anos. Os stories são fotos ou vídeos curtos, de até 15 segundos de duração, que ficam disponíveis por apenas 24 horas no perfil do usuário. Hoje, sua utilização não é mais restrita ao Snapchat, estando disponível em diversas outras plataformas, como Facebook, WhatsApp e Instagram.
Eles chamaram a atenção da estudante de Comunicação Social da UFV Ianka Silva, que foi orientada pelo professor Henrique Mazetti numa pesquisa de iniciação científica. “Eu vinha percebendo um aumento na exposição da vida pessoal nas redes”, relata Ianka, “antes, quando só se podia postar fotos de forma permanente no perfil, as pessoas se preocupavam mais em selecionar o que seria mostrado”. A pesquisa, cujo objetivo foi investigar os usos da ferramenta atrelados aos novos regimes de visibilidade — isto é, ao que a tecnologia permite que os usuários façam e sejam — teve duração de um ano e, como resultado, produziu reflexões acerca de quatro aspectos: autenticidade, privacidade, visibilidade e vigilância.
Autenticidade
A noção de autenticidade na utilização das fotos e vídeos instantâneos parte da possibilidade de customização do que é postado. As ferramentas permitem a utilização de filtros, marcadores de localização e horário, adesivos e emojis a serem incorporados ao conteúdo. O uso racional destes recursos pode proporcionar ao usuário uma espécie de personalidade virtual, tornando-o autêntico em relação aos demais.
Privacidade
A depender dos gostos e necessidades pessoais de cada um, compartilhar a vida online pode ser ou não uma prática atrativa. Em vista disso, os aplicativos de rede social permitem ao usuário que escolha para quem seus stories estarão visíveis. No entanto, para além dessa viabilidade de seleção de espectadores, a noção de privacidade relaciona-se à escolha do conteúdo a ser postado. Como explica Ianka, há uma divergência entre o senso comum e o científico quando se trata desse conceito. “É comum pensar que o privado é o oposto do público, mas eles caminham juntos: privacidade é o ato de selecionar o que virá a se tornar público”. Deste modo, compete ao usuário administrar os graus de exposição a que se submete.
Visibilidade
Atrelada, de certo modo, à ideia de autenticidade, a publicação de stories tornou-se um cenário também para a celebrização. A aquisição de notoriedade na rede tornou-se mais fácil com a ferramenta, uma vez que permite que seus seguidores o vejam com grande frequência e pode abrir um processo de identificação com o que é colocado em pauta, seja o dia a dia ou assuntos mais sérios. Além disso, os stories podem tornar visíveis campanhas, denúncias, apelos e uma série de outros fenômenos pontuais.
Vigilância
Por fim, concluiu-se que esse novo regime de visibilidade configura também uma intensificação da vigilância na rede. Mais do que nunca, é possível saber detalhes sobre a rotina, localidade e hábitos dos usuários — isto é, se eles o permitirem, considerando o pressuposto de privacidade. Posto isto, existe uma facilidade em observar a vida alheia, e, até certo ponto, conhecer uma pessoa sem necessariamente estabelecer contato com ela.
O estudo resultou no artigo “As stories e os novos regimes de visibilidade”, apresentado em 2018 no XXIII Congresso de Ciências da Comunicação na Região Sudeste, em Belo Horizonte, e publicado na revista da Sociedade Brasileira de Estudos Interdisciplinares da Comunicação (Intercom).