Estudante do Licena defende TCC em vídeo-registro em Libras e contribui para letramento de surdos em ciências da natureza

17 de junho de 2021


A ex-aluna do curso de Licenciatura em Educação do Campo (Licena) Regiane Aparecida de Oliveira ingressou como caloura na UFV em 2014, sendo a primeira estudante surda da UFV a se comunicar em Libras, a Língua Brasileira de Sinais, tendo o português na modalidade escrita como segunda língua. Em sua graduação, ela enfrentou grandes desafios para vencer as dificuldades de aprendizado e as barreiras de comunicação com seus professores e colegas.

Boa parte dessas dificuldades se justificava pela ausência de terminologias na Língua Brasileira de Sinais que contextualizassem, com mais precisão, termos utilizados no curso. Para palavras como “agricultura”, “roça”, “sítio” e “rural” era usado um único sinal em Libras. Este é apenas um exemplo. Como Regiane poderia entender conceitos tão diferentes sem sinais representativos? A resposta veio com o auxílio cotidiano da equipe da Unidade Interdisciplinar de Políticas Inclusivas (UPI) da UFV e de colaboradores do projeto Alfabetização e Letramento na Unidade de Programas Inclusivos.

Com o diálogo mantido com professores e estudantes do Licena, Regiane procurava entender o significado das palavras da sua área de estudo em seus respectivos contextos. A partir desse entendimento, a estudante e a equipe de intérpretes e tradutores de Libras/Língua Portuguesa da UPI pesquisavam com a comunidade surda do país se já havia um sinal padronizado para um determinado termo aprendido. Caso não existisse, investiam na criação dele e depois na sua validação por surdos-linguistas. Foi se criando, então, sinais-termos para que Regiane tivesse acesso ao vocabulário do curso.

O resultado deste esforço está no Trabalho de Conclusão de Curso (TCC) que a agora ex-aluna da UFV defendeu no último mês de maio: A criação de glossário em Libras na área da Educação do Campo: a importância da criação dos sinais-termos para as Ciências da Natureza. Em atendimento à educação bilíngue, conforme o disposto na Lei Brasileira de Inclusão da Pessoa com Deficiência, o TCC foi integralmente desenvolvido na primeira língua da estudante, a Libras. A defesa ocorreu no formato de vídeo-registro, que obedece a todos os parâmetros de produção científica. Neste caso, foi um trabalho monográfico, estruturado em torno de um objeto construído e delimitado a partir de um problema ligado à área de estudos a que está vinculado.

É o primeiro trabalho defendido na UFV neste formato e uma grande contribuição da Universidade para a comunidade surda. A professora Michelle Nave Valadão, do Departamento de Letras (DLA), coordenadora da UPI e orientadora do TCC de Regiane, conta que trabalhos desta natureza permitem que se avance no letramento dos surdos, dando a eles a possibilidade de acessar um material originalmente produzido em Libras, sem a necessidade de tradução, como ocorre geralmente.

A maioria dos surdos produz seus trabalhos científicos a partir da leitura de artigos, dissertações e teses em português. Há poucas produções científicas em Libras. “É preciso valorizar a língua portuguesa, claro, mas é necessário também reconhecer como científico um trabalho feito na língua primária do surdo”, defende Michelle.

Os sinais convencionados e registrados no glossário produzido pela Regiane já foram apresentados em congressos e poderão auxiliar em aulas e atividades acadêmicas de outros estudantes surdos de cursos de Educação do Campo do país ou de pesquisadores de ciências da natureza. O objetivo é que ele seja utilizado como material didático. Sobre essas possibilidades, Regiane resume seu sentimento em uma única palavra: “feliz”.

Além da orientação da professora Michelle, o TCC foi coorientado pela professora Cristiane Lopes Rocha de Oliveira, do Departamento de Educação (DPE). Ambas dividiram a banca de defesa com Carlos Antonio Jacinto, ex-estudante de mestrado em Letras da UFV e atualmente doutorando, também em Letras, na Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Vale destacar que, por meio do projeto Alfabetização e Letramento na Unidade de Programas Inclusivos, colaboraram com o trabalho as professoras Rosa Cristina Porcaro e Danila Ribeiro Gomes, ambas do DPE, e Idalena Oliveira Chaves, do DLA, além de estudantes monitores.

O vídeo-registro pode ser conferido no link www.youtube.com/watch?v=glKMNvesBYU.